quarta-feira, 30 de maio de 2012

Crime de aborto e direitos humanos

Cândido Furtado Maia Neto *
A primeira Constituição do Império do Brasil, de 1824, a Carta Magna de 1891 e as Constituições dos Estados Unidos do Brasil, de 1934 e de 1937, não dispunham taxativamente sobre o asseguramento da inviolabilidade a vida. Em 1942, o Brasil passava pelo período do Estado Novo, regime ditatorial, quando entra em vigor o ainda atual Código Penal brasileiro, Decreto-Lei nº 2.848/1940. O artigo 128 do Código Penal prevê os únicos dois casos de aborto não punível: para salvar a vida da gestante; e se a gravidez resultar de estupro.

O aborto resultante de estupro é questionável, por inúmeras e diversas razões, desde a lógica jurídica da Verdade e da Justiça, pois o “Amor é substância criadora e mantenedora do Universo, constituído por essência divina” (Joana de Angelis por Divaldo Pereira Franco, in Amor, imbatível amor).

Na Carta Magna de 1937 não constava expressamente a inviolabilidade da vida, razão pela qual tipificou-se o aborto resultante de estupro. Em 1946, a Constituição dos Estados Unidos do Brasil, no artigo 141, expressa pela primeira vez a inviolabilidade da vida. Dois anos depois, em 1948, é aprovada a Declaração Universal dos Direitos Humanos das Nações Unidas, à qual o Brasil aderiu. Reza o artigo III: “Todas as pessoas têm direito à vida...”. Na sequência, a Constituição de 1967 e a de 1969, sob a égide do regime militar, continuam prevendo a inviolabilidade da vida, e a atual Constituição, de 1988, manteve  tal garantia.
Em 1992, o Brasil ratifica o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (ONU/1966) e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos (OEA//1969), instrumentos internacionais pelo direito à vida inerente ao ser humano. Após uma década, em 2002, o Brasil ratificou a Convenção sobre os Direitos das Crianças (ONU/1989), reforçando o direito inerente à vida dos menores de 18 anos de idade.

A inviolabilidade da vida é assegurada por lei desde o momento da concepção (artigo 2º do Código Civil de 2002), em proteção integral à família (artigo 226 CF/88), onde o nascituro é considerado ser humano sujeito de direitos, que se findam apenas com a morte. A personalidade civil da pessoa é tema disciplinado pelo Código Civil. Qualquer mudança na legislação penal, que amplie o contido no artigo 128 do CP, permitindo aborto “legal” (por anencefalia), atenta contra o direito constitucional sobre a inviolabilidade da vida.

O Código Penal de 1942 foi “recepcionado” de fato e não de direito; porque a Carta Magna de 1988 revogou o instituto do decreto–lei, do regime antidemocrático; em seu lugar surgiram as Medidas Provisórias; inclusive, o presidente da República está proibido de editar Medidas Provisórias em matéria de direito penal. Nem por Emenda Constitucional se permite proposta tendente a abolir direitos e garantias individuais (leia-se, inviolabilidade da vida), por se tratar de cláusula pétrea.
Com todo o respeito, datíssima vênia, a decisão do STF de 12.04.2012 foi além da Lei Maior, quando incluiu mais uma forma impunível de aborto (anencéfalo), no artigo 128 do Código Penal de maneira inconstitucional, ao autorizar a execução da vida intrauterina. À Suprema Corte compete o controle da inconstitucionalidade das leis na Justiça pela Vida. Não existe “justiça pela morte”, pois nos regimes democráticos à luz dos direitos humanos não aceitam a execução capital (artigo 5º, XLVII “a” , CF/88), nem mesmo no mais hediondo homicídio.

A força da vida que ilumina, que nasce, que ergue ou que abate está em todos nós (do livro Busca e acharás, psicografia de Francisco Cândido Xavier), faz parte da evolução moral, através do livre arbítrio e da consciência de cada um, na verdadeira lei natural de causa e efeito.
Procurar e promover a Justiça é responsabilidade individual e coletiva, para a tutela indisponível dos direitos humanos na preservação da vida.

* Cândido Furtado Maia Neto, professor, é procurador de Justiça  do Ministério Público do Estado do Paraná. (**) Diego de Lima Soni, advogado, é assessor jurídico da Procuradoria-Geral de Justiça, do Ministério Público do Estado do Paraná.

Fonte:http://www.jb.com.br/sociedade-aberta/noticias/2012/05/30/crime-de-aborto-e-direitos-humanos/

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