Segurança e homofobia.
Uma visão de dentro para fora.
Artigo de opinião.
Estou em Portugal para
cursar uma especialização em Ciências Forenses, logo, todo tipo de assunto
relacionado a crimes e a segurança em geral me chama a atenção. Leio o jornal
impresso local quando posso e parece engraçado porque meus olhos passam pelas
notícias e param quando leio sobre violação sexual, assalto, atropelamentos e
coisas do gênero. Fui surpreendido há pouco tempo com um comentário em uma rede
social onde meus colegas brasileiros que aqui estão reclamavam da forma
agressiva utilizada por um segurança de uma casa noturna colocou um brasileiro
pra fora da casa, batendo e dizendo coisas absurdas. O comentário seguinte
dizia que ao sair de lá ele se dirigiu até a polícia de segurança pública,
(PSP), ao expor o fato ocorrido o policial se recusou a fazer o registro de tal
ocorrência pelo simples fato do jovem não ter se dirigido até o hospital onde
seria constatada a agressão através de um exame básico de corpo de delito. O
terceiro comentário fomentava a ideia de se tratar de homofobia tanto por parte
do segurança, como por parte do policial.
Após ler os comentários
comentei com um colega sobre o assunto, pedi mais detalhes, afinal de contas o
assunto era de meu interesse. Não havia detalhes, só as informações que foram
postadas. O assunto não se estendeu. Teci um comentário com o colega dizendo
que a história estava mal contada e que o colega agredido deveria ter “aprontado”
dentro da casa noturna para que o segurança agisse com agressão, até porque
ninguém em sã consciência bateria em ninguém de graça. O colega se virou contra
mim e me chamou também de homofóbico, disse que meu comentário era
completamente vazio de argumentos e que o colega havia apanhado por homofobia
sim.
Como estudo temas
ligados às Ciências Forenses tenho sempre em mente que para resolução de um
caso é preciso responder cinco perguntas básicas, (QUEM? , COMO?, ONDE?, QUANDO?
e POR QUE?). Só após essas perguntas respondidas podemos iniciar as linhas de investigações
e darmos uma resposta ou para a sociedade ou para quem nos contrate.
Percebe-se que como
profissional eu estava sem dados precisos, eu tinha a resposta para o Quem,
para o Como, para o Onde e para o Quando, mas faltava-me o Por que ?. O assunto
ficou por ali e logo foi esquecido pela comunidade brasileira.
Durante minhas aulas na
especialização eu tenho de estudar um pouco de intervenção com o agressor e com
a vítima e durante uma aula de Profilling Geográfico voltado para crimes de
abuso sexual, tive uma explicação técnica de que para que haja um crime, seja
ele qual for, é preciso que se reúnam três personagens que são necessárias para
a conclusão do delito.
A primeira seria um agressor com ”animus” para cometer o ato delituoso ou criminoso, o segundo seria uma vítima que esteja na posição de vítima, pronta para ser atacada e o terceiro e último elemento é a ausência de um guardião.
A primeira seria um agressor com ”animus” para cometer o ato delituoso ou criminoso, o segundo seria uma vítima que esteja na posição de vítima, pronta para ser atacada e o terceiro e último elemento é a ausência de um guardião.
Como primeiro exemplo,
usarei um furto em uma residência:
A primeira personagem seria o “ladrão” que está do lado de fora à espera do momento certo para o ataque. A segunda personagem sou eu ou a minha casa onde há um bem a ser furtado e a terceira personagem é o portão e a porta sem trancas ou sem um cão.
Como segundo exemplo,
usarei um estupro na madrugada:
A primeira personagem
seria o estuprador que saiu de casa com o intuito de abusar de alguém. A
segunda personagem é uma jovem senhora de trinta e dois anos e a terceira
personagem é o aparelho celular que toca de cinco em cinco minutos e do outro
lado é o marido da vítima que quer saber onde ela está, se já apanhou o ônibus,
ou poderá ser também esta terceira personagem um grupo de pessoas, mesmo que desconhecidas
que estão na paragem a espera do ônibus.
No primeiro exemplo
temos a presença das duas primeiras personagens e das duas segundas
personagens, mas temos no primeiro exemplo a ausência do guardião e no segundo
exemplo a presença do guardião.
Após essa aula, iniciei
uma meditação sobre os casos de homofobia que eu tinha conhecimento e em sua
maioria, não em sua totalidade, deixo claro, além da ausência de algumas das
cinco perguntas principais para a resolução de um caso, faltava em meu ponto de
vista, a presença de uma das três personagens do Proffiling. Com estes dados faltosos não é possível chegar
a uma conclusão fatídica sobre haver ou não haver homofobia nos casos
observados.
Coloquei o tema em
pauta com algumas pessoas de meu círculo de amizades e todos chegaram à mesma
conclusão que eu. Ouvi de uma amiga psicóloga que eu estava certo,
principalmente no que fazia alusão a segunda personagem. Ela havia estudado
alguns casos também, mas pela ótica psicológica e chegou a conclusão que nos
casos estudados por ela a vítima se colocava em um patamar de possível agredida,
digamos que ela facilitava o ato ou buscava ou concorria para que as coisas
fossem seguindo o caminho da agressão.
Assistindo a uma
entrevista com o sociólogo polonês Zygmunt Bauman,
autor de dezenas de obras dentre elas “modernidade líquida”, me senti
completamente preso quando ele falava que “uma das
características de nosso tempo é a fragmentação da vida” e essa fragmentação expressa
também na forma como as relações humanas se dão.
Um dos
pontos da entrevista que mais me chamou a atenção foi quando Bauman citou
Freud, que no livro
"O mal-estar na civilização" já apontava que a civilização
sempre inclui troca: dá-se algo de valor para receber algo de valor. “Se na
época do livro, final da década de 1920, antes do crash e da Grande Depressão,
o preço era entregar muita liberdade em nome da segurança, hoje talvez Freud
dissesse que entregamos demais nossa segurança em nome de mais liberdade”,
considerou o sociólogo.
Neste
contexto, voltei novamente a indagar-me sobre os casos de homofobia que eu e
minha amiga psicóloga havíamos tomado como base para nossas reflexões e me
perguntei:
- Será
que em troca de uma liberdade não temos nós deixado de lado a nossa segurança?
Até que
ponto alguém se expõe ao perigo de poder ser atingido por um soco ou até mesmo
estando apto para a perda de sua vida para brigar e defender sua liberdade?
Seja esta liberdade física, de expressão, de ação, ou até mesmo a liberdade de
ir e vir como reza nossa constituição.
Até que
ponto o “eu” está disposto a ceder o seu bem estar físico, psíquico e moral
para que as pessoas que vivem ao seu redor saibam que esse “eu” tem direitos
como os demais?
Para
concluir este emaranhado de pensamentos creio que é preciso que antes de sair
de nossas casas analisemos qual o papel iremos exercer diante da sociedade e
não sermos atingidos pelos aplausos da plateia ou nem mesmo pela vaia dos críticos.
Sabendo que minha personagem é essa ou aquela e não me colocar em outra forma
de atuação que não seja a minha. Saber a hora de me impor e saber qual a hora
de ceder. Saber que o direito do colega termina onde o meu começa, mas o
direito dele inicia-se onde o meu termina e essa autonomia ou esse controle que
eu tenho sobre as disposições do direito exercido por mim e pelo outro seja
sempre o guardião presente que evita que eu seja a vítima em um próximo caso.
Josecler Alair
Perito Judicial
Pós-graduando em Ciências Forense
–
Instituto CRIAP – Portugal – Julho / 2013.
josecler.rj@hotmail.com
Eu não achei que o seu comentário tenha sido homofóbico, muito pelo contrario, você apenas expôs que ninguém apanha e é retirado de uma casa noturna do nada, nem ai em Portugal e nem aqui no Brasil.
ResponderExcluirCom certeza algo aconteceu. Porém falta de informações deixam com que tenhamos qualquer tipo de interpretação.